Influenciar o comportamento das pessoas sempre foi ambição dos governos, empresas privadas e iniciativas do terceiro setor. As últimas descobertas da ciência vêm demonstrando, entretanto, que o caminho mais assertivo não é mudar a mentalidade das pessoas, mas seus ambientes.
Treinamentos, campanhas de conscientização, campanhas publicitárias, leis, políticas corporativas e governamentais, psicoterapias, coaching, literatura de autoajuda, meditação, campanhas de arrecadação de recursos... O que todas essas práticas têm em comum?
O objetivo de influenciar as ações das pessoas – sejam cidadãos, colaboradores, consumidores, fornecedores, parceiros, investidores ou potenciais doadores – e, com isso, aumentar seu bem-estar, impactar os negócios e criar transformações sociais.
Podemos dividir essas tentativas de influenciar o comportamento das pessoas em dois tipos: focadas no contexto ou dirigidas à cognição. Essa divisão é baseada nas descobertas das ciências comportamentais (psicologia, economia comportamental, neurociências etc.), dos últimos 30 anos, que moldaram a concepção atual da mente e do comportamento humano, sendo muito bem sintetizadas por Daniel Kahneman em seu livro Rápido e Devagar (Editora Objetiva, 2012).
Kahneman usa dois personagens para falar sobre uma só mente: o Sistema 1 e o Sistema 2. O Sistema 1 é automático, realiza várias operações simultaneamente, é rápido, exige pouco ou nenhum esforço, não necessita de nenhuma percepção de controle voluntário, operando através da intuição e de atalhos. Já o Sistema 2 é reflexivo, consciente, exige esforço mental, funciona de forma sequencial e opera através do pensamento deliberativo.
Uma metáfora comumente empregada no meio para se referir ao modelo dual de funcionamento da mente humana é a do elefante e do condutor (Sistemas 1 e 2, respectivamente); o condutor deliberadamente olha para o mundo e pondera para onde ir em seguida, mas é o elefante quem está realmente no controle na maior parte do tempo.
As tentativas tradicionais de mudanças comportamentais sempre apostaram em mudar a mentalidade das pessoas - isto é, são dirigidas à cognição, o Sistema 2 - principalmente através da disponibilização da informação (a conscientização) e das boas intenções ou força de vontade. Porém, essas tentativas nem sempre são bem sucedidas. Um estudo de 2002 (Mind the Gap: why do people act environmentally and what are the barriers to pro-environmental behavior?) publicado por Anja Kollmuss e Julian Agyeman na revista Environmental Education Research sobre comportamentos pró-ambientais, por exemplo, nos mostra que pelo menos 80% dos fatores influenciando tais comportamentos são contextuais, não envolvendo o conhecimento ou a consciência. Além disso, nossas intenções e preferências não são estáticas: quem nunca passou por situações, como querer emagrecer, mas se alimentar de junkie food ao final do dia? Ou economizar para alcançar uma meta de longo prazo (comprar um carro, um apartamento), mas acabar gastando as economias em compras de impulso?
Ao mesmo tempo em que o progresso tecnológico nos proporcionou inúmeros confortos, também nos proporcionou diversos efeitos colaterais indesejados. Há um século, aproximadamente 10% da mortalidade humana era resultado de más decisões. Atualmente, esse índice é de aproximadamente 40%, com as doenças crônicas como enfarto, câncer e diabetes sendo resultados de más decisões contínuas (hábitos ou estilos de vida).
Uma nova abordagem
Um consenso geral entre os cientistas comportamentais da atualidade é a influência desproporcional e subestimada do ambiente na tomada de decisões e mudanças de comportamento. Por isso, uma nova abordagem focada no contexto – e, consequentemente, agindo mais sobre o Sistema 1 - vem revolucionando os diversos setores: a arquitetura da escolha ou nudging. Como definem Richard Thaler e Cass Sustein no livro Nudge: o empurrão para a escolha certa (Editora Elsevier, 2008) a arquitetura da escolha organiza o contexto no qual as pessoas tomam decisões.
Com base nas descobertas das ciências comportamentais, o arquiteto da escolha projeta contextos para influenciar de forma previsível e sistemática as decisões das pessoas. Estes projetos podem ser aplicados tanto no setor público (esfera de onde se originou), quanto no setor privado e terceiro setor, para melhorar o bem-estar, aumentar lucros, receitas, produtividade, reduzir custos e arrecadar mais recursos.
É claro que as diversas descobertas das ciências comportamentais, as ferramentas e métodos de arquitetura da escolha não poderiam ser todas contempladas nesse artigo, mas podemos dar algumas dicas gerais sobre como influenciar as ações das pessoas. As mais óbvias são definir o comportamento chave e remover os obstáculos para estes comportamentos.
1. Como já dizia aquela velha frase sobre gestão "você não pode gerenciar o que não pode mensurar". E você não pode mensurar o que não especificar. Portanto, antes de tentar mudar ou influenciar algum comportamento, descreva-o de forma específica, sabendo claramente quando ele ocorreu ou não.
2. Use o caminho da menor resistência. Pode ser difícil encontrar os diversos obstáculos, barreiras ou ruídos que atrapalham a ocorrência de determinado comportamento, mas certamente ao encontrá-los e removê-los, você garante que a probabilidade de ocorrência do mesmo aumente consideravelmente.
Além disso, vá além do bom senso e olhe para a ciência. Não é apenas ineficiente, mas também negligente não utilizar os atalhos que os conhecimentos científicos nos dão sobre o comportamento humano. Seria algo parecido com reinventar a roda toda vez que um novo carro for criado, ignorando todos os conhecimentos da física a respeito.
O Behavioural Insights Team (também conhecido como o “Nudge Unit”) criou um framework chamado MINDSPACE (acrônimo de Mensageiro, Incentivos, Normas, Default, Saliência, Priming, Afeto, Comprometimento e Ego) que tenta sintetizar em nove fatores os princípios científicos do comportamento. Da mesma forma, Robert Cialdini fala sobre os seis princípios chaves para persuasão: reciprocidade, compromisso e coerência, aprovação social, autoridade, afeto e escassez. Esses princípios e frameworks podem ser utilizados para definir e diagnosticar problemas comportamentais, e projetar e testar soluções contextuais na forma de arquiteturas da escolha, indo além do bom senso e trazendo as ciências para os assuntos humanos.