Paulo Caetano
A crise que abala o mundo, exigindo redefinição de rumos, princípios e medidas emergenciais dos governos, não é apenas econômico-financeira, mas de todas as ordens imagináveis, cobrando posicionamento de todos os segmentos e agentes sociais.
A principal característica dessa conjuntura que o modismo vem chamando de pós, mas que assim é somente em relação ao que veio antes, é que o mundo está virando cada vez mais uma gigantesca rede, não somente no sentido de que tudo é posto na claridade das telas e espaços virtuais, mas também das conivências e responsabilidades que passam a ser divididas. Os desafios, portanto, não se colocam apenas a uma pessoa ou entidade – o governo, por exemplo -, mas a todo mundo; sendo utópico, pois, como insinuam certas análises messiânicas, esperar respostas de Barack Obama, para problemas que vão da solução de arraigados conflitos bélicos ao preocupante aquecimento global, passando pela instantânea crise financeira, embora estejamos falando do presidente eleito da nação mais importante do mundo.
Nesse caldo de coisas, a contabilidade vem se obrigando a mudanças que vão muito além da simples adoção de novas tecnologias, regras e procedimentos, assimilando que a questão não é somente de forma mas também e principalmente de conteúdo. Se, nos escândalos de quebra de grandes empresas, como Ahold, Enron, WorldCom, Tyco, Vivendi e Stanley Steel, entre outras, a contabilidade foi acusada de mascarar os problemas, que se agravaram com o tempo, na atual crise dos bancos americanos, ela contribuiu apontando rapidamente o foco crítico, permitindo reação pontual.
A convergência das normas brasileiras de contabilidade com o padrão internacional ( Lei 11.638/2007), que estamos discutindo amplamente, é interpretada como tendência para que a contabilidade fale o mesmo idioma, em todos os países. Como explicou o professor Hugo Rocha Braga, estudioso da lei, ela tem impacto sobre toda a contabilidade – escrituração, demonstrações, etc -, fortalecendo-a como instrumento imprescindível de decisão, em todos os níveis, nas empresas, no setor público, até mesmo nas finanças domésticas.
As exigências ampliam-se com a implantação do Sistema Público de Escrituração Digital (Sped), iniciativa da Receita Federal do Brasil que colocará em rede todas as informações das empresas. A motivação é evidentemente fiscal, mas o impacto é mais amplo, traduzindo-se em visibilidade e transparência.
Mas se estamos avançando em termos de modernização, aperfeiçoamento dos sistemas contábeis, facilitando a identificação de focos podres na economia, permitindo corrigir falhas, digerir crises, no campo social, que é, no fundo, o que conta e faz sentido, andamos muito lentamente, lamentavelmente, sequer conseguimos criar um estado de segurança mínimo para que nossas crianças possam ir à escola e voltar para casa, sem correr riscos como o que tirou a vida da menina Rachel, em Curitiba. Onde erramos?
Contador, empresário da contabilidade e presidente do CRCPR; e-mail: pcaetano@pcaetano.com.br